Por que o Impeachment não é golpe?

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Tema da ordem do dia é a possibilidade de impeachment da presidente Dilma. Há manifestações jurídicas, políticas ideológicas e apaixonadas sobre a matéria, favoráveis e contra o afastamento, o impedimento da presidente, que perderia o mandato que lhe foi outorgado pelo voto do povo em outubro do ano passado. De tudo que tem sido dito, o maior absurdo é falar em golpe.

Com efeito, a atual Constituição Federal, em vigor desde 1988, elaborada democraticamente e festejada por todos como a “Carta Cidadã”, em seu art. 85disciplina e prescreve as hipóteses jurídicas em que o Presidente da República cometerá crime de responsabilidade, remetendo a definição dos mesmos para a lei especial. Ou seja, o processo é legal e constitucional, conforme vontade prévia do povo e das instituições democráticas.

Ainda pela nossa Lei Maior, a competência para processar e julgar o Presidente da República nos crimes de responsabilidade é do Senado Federal (art. 52, I, CF), após autorização da Câmara dos Deputados, por dois terços dos seus membros (art. 51, I,CF), sendo certo, outrossim, que, durante o processo de julgamento dos crimes de responsabilidade, comandará os trabalhos no Senado o presidente do Supremo Tribunal Federal (art. 52, parágrafo único). Disto resulta que o Senado, no caso, não estará exercendo o seu dever-poder típico, isto é, o legislativo, de elaborar as leis, mas sim o poder atípico jurisdicional, ou seja, o de julgar, em caráter definitivo, alguém. Percebe-se, que o processo, além de legal e constitucional, tem garantias, especialmente quanto a repartição de poderes e controle dos mesmos, tudo democraticamente.

Portanto, na forma de nossa Constituição, a Lei das Leis, que é a essência de nossa Democracia, o processo de impeachment tem início na Câmara dos Deputados, a partir da apresentação da denúncia por qualquer cidadão, pois cabe privativamente a esta a instauração do processo contra o Presidente da República e, admitida a acusação pela Câmara dos Deputados, o processo será encaminhado ao Senado Federal, para julgamento, devendo se assegurar ao Presidente da República processado, evidentemente, integral direito ao contraditório e à ampla defesa.

Ainda conforme a nossa Constituição Democrática, a condenação do Presidente da República pela prática de crime de responsabilidade, que somente será proferida pelos votos de dois terços (2/3) dos membros do Senado Federal, em votação nominal aberta, acarretará a perda do cargo, com a inabilitação por oito (8) anos, para exercício de funções públicas, sem prejuízo das demais sanções judiciais cabíveis (CF, art. 52, parágrafo único). A sentença será formalizada por meio da expedição de resolução do Senado Federal, a qual o Poder Judiciário não dispõe de competência para alterar ou controlar o mérito, mas somente corrigir eventuais vícios de procedimento. Tudo isso, conforme prescrito pela constituição democrática em vigor e precedentes do Supremo Tribunal Federal, tribunal da Democracia.

Desta forma, dois atores fundamentais nos respondem que o impeachment não é golpe: o povo e a Constituição. O povo, via os seus representantes, fez a Constituiçãoque previu e disciplina o processo de impeachment, bem como elegeu os congressistas, que irão dizer do cabimento e da procedência, ou não, de cada pedido. Esse mesmo povo e a sua Constituição em vigor, criou e decide o impeachment. E povo, cujo poder é soberano, baseado na Constituição, instrumento jurídico e político de expressão da vontade soberana do povo, nos dizem, de forma clara, ao ensejo dos artigos 85, 52 e 51 da Lei Maior: impeachment não é golpe, é parte da democracia.

 

AUTOR: Georges Humbert

Advogado e Professor

Professor do Brasil Jurídico, preparatório para carreira jurídica. Professor titular do Centro Universitário Jorge Amado. Advogado, é membro efetivo do centenário Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB). Graduação em direito pela Universidade Católica de Salvador (2005). Mestrado (2007) e Doutora…

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